Pode-se
dizer que Samurai X – O Filme seja um divisor de águas no cinema de fantasia,
pelos menos no quesito adaptações de mangás, pois não lembro de ter visto uma
adaptação de HQ nipônica, mesmo que estas sejam raras, tão levada à serio antes
como tal. Sempre foi o sonho de todos os fãs de animes e mangás verem boas
adaptações em live-action de suas
obras favoritas, algo que sempre se mostrou uma carência desta “tribo” e que
tosqueiras como Dragonball: Evolution só pareciam afastar ainda mais da
realidade.
Esse é o
filme que eu mais tava ansioso pra ver ano passado (Sim, mais até que The Dark
Knight Rises e Vingadores), mas só consegui assisti-lo no dia primeiro de
janeiro, e abri o ano com chave de ouro por causa disso.
O roteiro
do longa trabalha em cima dos dois primeiros arcos do mangá, a saga Jin-E e a
saga Oniwabanchu (Mas sem a Oniwabanchu!) , fazendo um mix das duas, e consequentemente tendo que
modificar alguns “detalhes” e acrescentar outros. Como no caso de Yahiko e
Sanosuke, que não tem suas respectivas estórias contadas. Eles simplesmente
estão ali. Embora a essência dos personagens permaneça a mesma e dê pra
entender “por alto” seus passados, fica aquele vazio incomodo de backgrounds
tão interessantes como os desses personagens terem sido deixados de lado. Algo
que claramente é perdoado, já que estamos em um longa de pouco mais de duas
horas e não em um mangá ou anime enorme onde muitas histórias paralelas podem
ser contadas.
E em
adendo às compensações, algumas inclusões são bem legais, como a primeira
aparição de Megume e como a moça foi escravizada por Kanryo. No mangá ela já
aparece como uma médica que é obrigada pelo magnata a fabricar ópio, mas não
vemos exatamente como a relação de ambos começou. Aqui isso é mostrado de
maneira muito inteligente em uma ótima cena onde a moça é obrigada a sacrificar
seus companheiros médicos em uma cilada e passar para o lado de Takeda ou
morrer.
E o filme também
consegue dar conta de muita coisa sem soar apressado e podado. Com um ritmo
lento e compassado, a lenda do ex-retalhador que abandonou a vida de
assassinatos para se tornar um andarilho que fez um juramento de não mais matar
é contada com precisão e fidelidade. Tanto a origem quanto a caracterização de
cada personagem principal é retratada com realismo e sem soar caricato. Os que
mais beiram ao exagero são Sano e Kanryo, com suas personalidades explosivas e
seus cabelos cartunescos, mas não chegando ao extremo. Fora isso, todas as
devidas adaptações foram realizadas com bom senso. Prova disso é Saito, que
mesmo sem as enormes franjas que lhe cobriam o rosto (Graças a Deus!) e menos
cínico que na versão de papel, manteve a essência e se mostrou um dos grandes
acertos do longa, ainda que suas cenas de ação sejam menores comparadas às dos
outros. Kaoru provavelmente é a personagem que mais se aproximou da versão criada
por Nobuhiro Watsuki, conseguindo manter o equilíbrio entre o humor, o drama e
o romance. E Jin-E consegue transmitir a tensão e a densidade originais, dominando
também as cenas mais violentas da fita.
Há vários
momentos emblemáticos e artisticamente bem dirigidos em Samurai X – O Filme:
Kenshin e Kaoru conversando dentro do dojo iluminado belamente pelas luzes do
sol; Kenshin recebendo seu kimono vermelho e o vestindo pela primeira vez; a
luta na chuva entre o herói e Saitou; o andarilho olhando uma mulher chorar
copiosamente a morte de um ente e relembrando seu passado. Falando nisso, o
ritmo deste longa lembra muito o do OVA que conta o passado de Kenshin e sua
relação conturbada com a esposa Tomoe e a guerra do Shogunato. Muitas vezes
denso e com uma trilha sonora dramática, mas sem deixar de lado o humor que a
série sempre teve, embora aqui um pouco mais dosado.
Claro que
nem tudo é perfeito e agrada a todos. Muitos podem reclamar das modificações
feitas em relação ao original, principalmente no que diz respeito ao acréscimo
de personagens que inexistem no mangá ou no anime, como os dois capangas de
Kanryo, o da mascara (que jpa gerou várias teorias dos fãs, os quais clamam
este ser Hanya, ou Gein, ou mesmo Enishi) e o outro que luta com Sanosuke na
reta final. Outro ponto que achei que os realizadores do filme se perderam, não
exatamente neste, mas na continuação (já confirmada), é no caso de Aoshi e da
Oniwabanshu. Pois com certeza eles serão inseridos no próximo ou próximos
filmes da possível franquia, e se isso acontecer o filme será bem infiel à obra
original, pois Kanryo Takeda já foi usado neste primeiro filme, e ele,
juntamente com sua metralhadora e a origem de Megumi, são peças essenciais no
arco do Okashira e sua trupe de ninjas.
Também não
achei que foi exatamente um ponto positivo Kenshin contar para Megumi a
história de sua cicatriz logo de cara, sendo que este era um dos maiores
mistérios do mangá, e o mesmo suspense poderia ser aproveitado futuramente. E
falando no protagonista, a dicção preguiçosa e baixa e falta de humor pode
gerar reclamações dos mais chatos. Takeru Sato tem uma aparência legal e está
bem caracterizado, não caindo no ridículo, mas passa longe de toda a essência
de um personagem tão carismático quanto Kenshin Himura.
Dirigido
por Keishi Ohtomo e roteirizado por Kiyomi
Fujii, Samurai Xconsegue ser um dleite tanto para os fãs da série quanto para
quem não a conhece, pois funciona muito bem isoladamente como um filme de
samurai. E apesar de todas as mudanças feitas (a maioria delas necessárias),
consegue o mais importante (depois, claro, de ser um bom filme em si): Capturar
a aura da obra original, o que pra mim é algo soberbo. As cenas de diálogos no
restaurante, com Megumi flertanto com Kenshin e Kaoru sentindo ciúmes, Sano
saindo do dojo se espreguiçando e com fome, os movimentos de luta que conseguem
incrivelmente ser iguais aos da versão inspiradora, etc. Tudo isso, ao
contrário de outras adaptações que em sua maioria parecem se passar em um
universo totalmente diferente do qual foram baseadas, remeteu minha memoria
emocional diretamente à versão original pela qual tenho tanto carinho.
No aguardo das versões
em carne e osso de Aoshi, Shishio e Enishi!